Tempo, tempo, tempo, tempo...

terça-feira, 13 de abril de 2010

Crônica sublime (2)

Rubem Braga realmente me encanta com as suas crônicas tão singelas, tão puristas...
Aí vai uma "sorvetinho de morango" desse autor que nunca deixa a desejar!
NEGÓCIO DE MENINO
Tem dez anos, é filho de um amigo, e nos encontramos na praia: - Papai me disse que o senhor tem muito passarinho... - Só tenho três. - Tem coleira? - Tenho um coleirinha. - Virado? - Virado. - Muito velho? - Virado há um ano. - Canta? - Uma beleza. - Manso? - Canta no dedo. - O senhor vende? - Vendo. - Quanto? - Dez contos. Pausa. Depois volta: - Só tem coleira? - Tenho um melro e um curió. - É melro mesmo ou é vira? - É quase do tamanho de uma graúna. - Deixa coçar a cabeça? - Claro. Come na mão... - E o curió? - É muito bom curió. - Por quanto o senhor vende? - Dez contos. Pausa. - Deixa mais barato. . . - Para você, seis contos. - Com a gaiola? - Sem a gaiola. Pausa. - E o melro? - O melro eu não vendo. - Como se chama? - Brigitte. - Uai, é fêmea? - Não. Foi a empregada que botou o nome. Quando ela fala com ele, ele se arrepia todo, fica todo despenteado, então ela diz que é Brigitte. Pausa. - O coleira o senhor também deixa por seis contos? - Deixo por oito contos. - Com a gaiola? - Sem a gaiola. Longa pausa. Hesitação. A irmãzinha o chama de dentro d'água. E, antes de sair correndo, propõe, sem me encarar: - O senhor não me dá um passarinho de presente, não?

Nenhum comentário: