Tempo, tempo, tempo, tempo...

domingo, 30 de maio de 2010

O MAU USO DA LÍNGUA

A língua não tem osso; daí vem o abuso que dela fazem. Fala-se por necessidade, por hábito, por vontade. Fala-se com convicção ou por ignorância; com sinceridade ou má fé; como homem ou papagaio; racional ou brutalmente. Fala-se sempre. Para certa gente, deixar de falar seria martírio, suplício, purgatório. Sentir a língua dentro da boca e não mexer com ela, ou mexer com ela e não fazer barulho... Que desapontamento horrível para um tagarela de profissão, que faz da língua o seu alimento, a sua distração, a sua companhia! Há por aí línguas mais salgadas do que as que vem do Rio Grande; mais afiadas que navalhas. mais movediças que catavento; mais daninha que ninhada de ratos em dispensa bem sortida. O elefante tem tromba, o boi chifres, o lobo dentes, a pantera garras, a víbora veneno, mas o homem tem a língua para se defender melhor. A língua que serve para cantar a alegria e fazer ouvir os acentos da dor, é muitas vezes pregoeira das fraquezas alheias, e quase sempre imprudente reveladora do que devia ficar oculto, origem de intrigas, discórdias que vem trazer resultados quase sempre funestos. A língua do sábio tem o cunho da sabedoria. A língua do ignorante tem a volubilidade da língua da caturrita. A primeira, move-se pouco, para dizer muito, a segunda move-se muito para não dizer nada. Uma é a afirmação da verdade, de que a outra é a negação. Há línguas de "ouro", de "prata" e até de "trapo"! Destas, a abundância é maior. Falar, falar e falar sempre, é a questão do dia. Fala-se na igreja, em público, em particular, às claras, às escondidas. Fala-se verdade, mentira, de Deus, dos homens, de todos, de tudo! Chova ou vente, haja sol ou sombra, a língua gira na boca como uma roda gira no eixo. Ninguém escapa à apreciação do homem sensato ou à tesoura de qualquer refinado maldizente. O que vestimos, o que comemos, o que fomos, o que somos e o que seremos - são temas que se prestam às variações de qualquer rabequista da moda. Se engordamos ou emagrecemos, se somos alegres ou tristes, bons ou maus,felizes ou desgraçados, procurados ou repelidos, inteligentes ou broncos, a língua de um ou ais parladores se incumbe de discutir e de esmerilhar com o zelo e a atenção que o caso pede. Não é raro ver-se um magricela que parece gafanhoto, censurando a magreza de outro, um caolho criticando um cego, ou um idiota a falar pelo nariz contra aas misérias do próximo. Sempre a "rir-se o roto do descosido e o sujo do mal lavado." ( Esta redação foi premiada - primeiro lugar - num concurso de redações promovido por um grande jornal de Minas Gerais ).

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